A sensação de fim de feira, fim de festa, fim do que conhecemos, é palpável.
Me debruço sobre a janela/espelho/facebook para ver as notícias editadas pelos amigos. O mundo acabou e nos alternamos entre uivar sobre os escombros ("que absurdo, que absurdo") ou fazer ensaios sensuais entre os destroços (o que leva a refletir que Nana Gouveia foi uma artista visionária, pós-contemporânea, pós-apocalíptica, mal compreendida em seu tempo).
Lembrei do filme do Bergman, "Morangos Silvestres", de 57, em que os personagens discutiam o absurdo de colocar filhos no mundo. O mundo já estava acabando - e como! - há sessenta anos. O mundo está acabando desde sempre.
Há dias ando angustiada com a absoluta irrelevância das minhas ações. O que poderia fazer de original no meio desta gritaria? E o que seria diferente, se eu criasse algo original?
Nada. Tudo. É a mesma coisa.
Lembrei de um dia - muito tempo atrás - em que estava especialmente triste, triste pra acabar, e que resolvi ouvir um disco que estava há anos na minha prateleira, dentro do plástico, lacrado. Pensei: "já que é pra acabar, deixa pelo menos eu tocar este disco que comprei e nunca ouvi".
O disco - do grupo Língua de Trapo - era bobo. Não era especialmente bom, mas o gesto me tirou da imobilidade, da sensação irreal de que não havia mais nada a fazer ou a dizer. Peguei o que me cabia e fui viver em outro lugar, mudei de cidade, mudei de vida, fui saber quem eu era longe das circunstâncias dadas.
(*No caminho, verifiquei o que o Cortazar - senão me engano - já tinha apontado: a loucura é portátil. Mas esta é outra história.)
Hoje lembrei daquele dia. Hoje eu precisava lembrar. Fui até o meu armário e peguei os ultimos discos da Marisa Monte - sim, eu comprei e não ouvi nenhum nenhum desde Amor I Love You, mas a culpa foi dela, quem mandou colocar trava pro iTunes? Passei a manhã ouvindo o Infinito Particular e o Universo Ao Meu Redor. São dois bons discos. Vou ouvir de novo.
Está tudo aqui, o universo todo é aqui. Nada e tudo. É a mesma coisa.
Mais um café. Enquanto o mundo acaba, a gente vive.
... sem anestesia.
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